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Perfil do Lund
Um botnico em Lagoa Santa

O enterro festivo de Dr. Lund
Estimado pelo povo de Lagoa Santa, pediu msica e proibiu lgrimas no funeral

Peter Lund era muito estimado pelos habitantes da pequena vila de Lagoa Santa, que costumavam cham-lo Dr. Lund. De hbitos excntricos e temperamento arredio, preferia o isolamento. Teve constantemente a seu lado Nereo Ceclio de Ramos, filho adotivo de Lagoa Santa que o auxiliava em tudo o que fazia. Ao morrer, distribuiu seus bens entre o filho e algumas pessoas que o serviram.

Casa de Lund em Lagoa Santa. Nos meses de seca, ele realizava expedies; na poca das chuvas, recolhia-se para estudo dos fsseis no galpo nos fundos da casa

No livro O Naturalista, de 1923, Nereu revela um pouco da personalidade do paleontlogo. "Ele conservou at os ltimos dias grande interesse pelo progresso da cincia, e sentia um grande prazer, quando na sua solido era informado a esse respeito. Era de um carter nobre, benvolo, amvel e caritativo (...) era por todos que o conheciam de perto muito considerado e respeitado pelo seu carter, honradez e modo independente de pensar, e indubitvel que a sua palavra e opinio tiveram grande peso no nimo dos homens de influncia da localidade..." Nereu cita ainda que Lund medicava na regio, sempre acertando o diagnstico. "O seu trato fidalgo, a todos dispensado, sem exceo de grandes ou pequenos, cultos ou ignorantes, fazia-o querido e respeitado pelo povo lagoa-santense..."

Lund viveu na mesma casa at a morte. Nos fundos, construiu um barraco para preparao e estudo de fsseis. Protestante, no poderia ser enterrado no cemitrio local. Comprou um terreno que mandou "murar para enterrar meus amigos e a mim tambm". Lund determinou que queria ser sepultado sombra de um pequizeiro -- rvore tpica do cerrado, que d um fruto aromtico -- num local aprazvel onde costumava estudar. Tambm ali foram sepultados seus colaboradores Pedro Andreas Brandt, Guilherme Behrens e Joo Rodolfo Mller. Ao lado do tmulo, marcado por uma lpide de mrmore negro, foi erguido um monumento a Lund e a Eugene Warning por iniciativa da Academia Mineira de Letras -- hoje tombado pelo Instituto do Patrimnio Histrico e Artstico Nacional.

O frondoso pequizeiro marca o local onde Lund est enterrado
Lund faleceu a 25 de maio de 1880, trs semanas antes de completar 79 anos. Como Nereo Ceclo escreve em carta famlia na Dinamarca, a ltima enfermidade durou cerca de dois meses. Ao fim, Lund delirava. "Dizia que o que ele mais amava eram as cincias e sobretudo a msica," Nereo relata. "Suas ltimas palavras foram: amor, amor, amor." Dias antes de morrer, Lund chamou o coveiro. Deu-lhe uma generosa gratificao e encarregou-o de abrir imediatamente sua cova, que deveria ter mais de vinte palmos de profundidade.
Lund chamou tambm a autoridade local e pediu que no o abandonasse at expirar para no haver demora na leitura de seu testamento, que continha recomendaes para execuo imediata. Solicitou uma grande festa para todos os moradores do arraial; frente do cortejo, deveria vir a Corporao Musical de Santa Ceclia -- primeira banda de msica de Lagoa Santa, fundada e custeada por Lund. Pediu msicas alegres e que ningum chorasse. Em sua casa, a mais farta mesa estaria posta, com os vinhos de sua adega.

Raquel Aguiar

Cincia Hoje/RJ
agosto/2001

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